A competência para conceder autorizações judiciais para o trabalho de adolescentes deve ser da Justiça do Trabalho e não da Justiça Estadual, como ocorre hoje. O entendimento é comum entre juízes e procuradores que participaram de seminários e conferências sobre o trabalho infantil nas últimas semanas.
Na quarta-feira passada (22/08), a questão foi debatida durante o I Seminário Nacional de Erradicação do Trabalho Infantil, promovido pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e pelo Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP). Na ocasião, o grupo de trabalho que discutiu as autorizações judiciais entendeu, por vasta maioria, que a Justiça do Trabalho precisa assumir essa função, em virtude da Emenda Constitucional nº 45/2004, que outorgou à JT a competência para processar e julgar todas as ações oriundas da relação de trabalho.
“O trabalho do adolescente, ou da criança, constitui uma relação de trabalho, independentemente da forma de contratação e da remuneração, e, como tal, deve ser autorizado pela Justiça do Trabalho. O adolescente que tem até 16 anos só deve trabalhar como forma de auxílio à sua formação profissional, o que deve ser avaliado pelo juiz competente para isso”, afirma o juiz do Trabalho Marcos Fava, auxiliar da Presidência do Tribunal Superior do Trabalho (TST).
Segundo dados do Ministério do Trabalho e Emprego, entre 2005 e 2010 foram concedidas 33.173 autorizações judiciais de trabalho para crianças e adolescentes de até 15 anos em todo o Brasil. Para os participantes do grupo de trabalho, as autorizações só devem ocorrer se estiverem de acordo com a Convenção nº 138 da Organização Internacional do Trabalho. O artigo 8º do documento prevê exceções para permissões ao trabalho de crianças e adolescentes em representações artísticas, desde que haja horário limitado e sejam definidas condições pela autoridade competente.
O mesmo entendimento prevaleceu entre os participantes da I Conferência Nacional do Trabalho Decente, promovida pelo Ministério do Trabalho entre os dias 8 e 11 de agosto. “O grupo de trabalho que discutiu a erradicação do trabalho infantil entendeu, por 96%, que a concessão de autorizações judiciais para o trabalho de adolescentes é de competência da Justiça do Trabalho. E as autorizações devem seguir o princípio da proteção integral previsto na Constituição Federal”, afirma a juíza do Trabalho Sandra Assali Bertelli, que é diretora de Recursos Humanos da Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho (Anamatra).
O artigo 227 da Constituição Federal estabelece que “é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão”.
O posicionamento constou do relatório final do grupo de trabalho e foi encaminhado para inclusão no relatório final da conferência, que contou com mais de 1.250 delegados, dos quais 30% representavam o Poder Executivo, 30% representavam empregadores; 30% representavam os trabalhadores e 10% eram de representantes de organizações da sociedade civil, além de cerca de 250 participantes na qualidade de convidados ou observadores.
O relatório serve de referência para parlamentares, na elaboração de políticas públicas, e para magistrados, na elaboração de decisões e formação de jurisprudência. Ao avaliar conflitos de competência sobre autorizações judiciais para o trabalho de menor de idade, em 2008, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu o tema como de conteúdo civil, sendo de competência da Justiça Estadual, conclusão que vem perdendo espaço entre os juízes e membros do Ministério Público envolvidos com o tema.