XXIX EMAT discute o novo Código de Processo Civil

 XXIX EMAT  

O Papel do Juiz frente ao novo CPC  

 

 

Fazendo uma analogia entre o poder de decisão do juiz e os mecanismos automático e manual de uma máquina fotográfica, o filósofo Noel Struchiner abriu os trabalhos do XXIX EMAT, que aconteceu nos dias 28 e 29 de agosto, em Mangaratiba, município da região de Itaguaí. O evento, que reuniu associados para o debate sobre os aspectos práticos do novo Código de Processo Civil (CPC) e suas principais inovações, foi organizado pela Amatra1, com apoio da Escola Judicial do TRT/RJ e patrocínio do Banco do Brasil.

 


"Se o juiz sistematicamente se afastar das regras, induzirá outros agentes decisórios a cometerem erros" (Noel Struchiner)


Em sua intervenção, Struchiner destacou que, quando o Direito incorpora o modo manual, o juiz é levado a embarcar no terreno moral, desafiando-o a fazer algo que ele não foi treinado a fazer, enquanto estudava, ou seja, chegar à decisão não apenas consultando o material jurídico, mas usando também a razão e a emoção, combinadas às regras.

Citando os modelos de tomadas de decisão, dentre os quais o particularista, onde as regras funcionam apenas como sugestões, e o formalista, que é baseado em regras, decompôs a tese das coisas que afetam as decisões, principalmente focando na questão dos dilemas morais que surgem ao longo do processo.

“O Direito é construído assim, com regras pré-programadas e com mecanismos os quais precisamos adequar. Se o juiz sistematicamente se afastar das regras, induzirá outros agentes decisórios a cometerem erros. Ao colocar a máquina demasiadamente no modo manual, nem sempre as fotos ficam boas”, analisou.  

Precedentes e Papel do Juiz

 

Com mediação do juiz Fábio Gomes, o segundo painel do evento teve a participação da procuradora Patrícia Perrone e do desembargador federal, Aluísio Mendes

 

 

No segundo dia do XXIX EMAT, a procuradora do Estado do Rio, Patrícia Perrone, falou sobre as mudanças que envolvem os precedentes, a partir da vigência do novo CPC. Trazendo o histórico em relação aos tipos existentes de eficácia de precedentes, deixou claro que, até então, não cabia reclamação para todo tipo de questionamento do descumprimento de uma decisão proferida em repercussão geral e que, agora, ampliam-se as hipóteses de precedentes normativos – que são decisões vinculantes, que produzem efeito erga omnes – e se admite a propositura de reclamação, caso haja inobservância das decisões da Corte.

“Com o novo CPC, a novidade é a eficácia normativa de todos os precedentes proferidos em casos repetitivos pelo STF, pelo STJ e pelos tribunais locais. Isso significa que, agora, os tribunais locais também terão seu incidente de julgamento de casos repetitivos e que a jurisprudência fixada por esses tribunais deverá, obrigatoriamente, ser observada pelos juízes de primeiro grau, sob pena de reclamação”, explicou Patrícia.

 

"É preciso que seja assimilada uma cultura de respeito aos precedentes judiciais" (Patricia Perrone)

 

A procuradora ressaltou que essa mudança preocupa os Tribunais, porque não há estrutura e servidores para lidar com o provável volume de reclamações que poderá acontecer. “Nosso sistema, como se encontra hoje, não pode ficar desse jeito. É preciso haver mais coerência e igualdade na jurisprudência produzida entre as Cortes. É preciso que seja assimilada uma cultura de respeito aos precedentes judiciais. E esse respeito depende dos juízes vinculados e dos tribunais, porque, se não prestigiarem seus próprios precedentes, e mudarem a jurisprudência a todo o momento, os juízes não têm condição de aplicar esses precedentes de forma coerente”, alertou.

Outra mudança apontada pela Procuradora diz respeito aos precedentes com eficácia intermediária, que são decisões que produzem efeitos para além do caso concreto das decisões proferidas, mas o descumprimento não está sujeito à Reclamação. Segundo ela, o novo Código determina que as súmulas simples do STF, em matéria constitucional, as do STJ, em matéria infraconstitucional, e as decisões do Pleno ou do Órgão Especial dos tribunais, devem ser, obrigatoriamente, seguidas pelos juízes

Fechando sua exposição, destacou que a otimização e a racionalização dos recursos que chegam ao Judiciário favorecem maior eficiência nas decisões. “É preciso tentar alocar esses recursos, para se dedicar à reflexão de matérias que ainda não estejam pacificadas. Essa é a lógica que justifica a inserção dos precedentes vinculantes”, ponderou ela, acrescentando que é uma ilusão pensar que os precedentes reduzem importância da atuação dos magistrados. “Será necessário haver permanente diálogo entre instância vinculada e vinculante, sob pena de esta segunda se desmoralizar por não ter seus precedentes cumpridos”, concluiu.

Fechando os trabalhos, o desembargador federal do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, Aluísio de Castro Mendes, trouxe alguns pontos do CPC que trarão impacto na magistratura. Entre eles, apontou a questão da conciliação e da mediação, que deverão ser estimuladas no curso do processo judicial. “Ainda que a Justiça do Trabalho já tenha a cultura da conciliação, haverá necessidade dos juízes se preocuparem mais com essa perspectiva e, também, apresentarem propostas de criação de órgãos ou recursos humanos que possam auxiliar nessa incumbência, buscando resultado profícuo com a conciliação”, disse o magistrado.

 

O desembargador Aluisio Mendes elencou as principais mudanças que impactam no dia a dia da magistratura

 

Em relação ao princípio do contraditório, ressaltou que a inovação está na determinação expressa de que o juiz não poderá decidir sem que tenha dado oportunidade às partes de se manifestar, mesmo que se trate de matéria sobre a qual deva decidir de ofício.

Sobre a gratuidade de Justiça, o desembargador evidenciou que houve um mix de incorporação de jurisprudência e de inovação, passando a dar mais liberdade ao juiz, que poderá conceder o direito ao parcelamento de despesas processuais. Além disso, poderá ser concedida em relação a algum ou a todos os atos processuais.

O polêmico Artigo 190, que versa sobre a licitude de as partes estipularem “mudanças no procedimento, para ajustá-lo às especificidades da causa e convencionar sobre os seus ônus, poderes, faculdades e deveres processuais, antes ou durante o processo”, também foi citado por Mendes.

“Esta flexibilização de procedimentos vem sendo tema de grandes teses, pois, por um lado, parece importante que as partes possam ter liberdade de acordarem regras procedimentais, mas, por outro, é uma liberdade cinzenta que mexe com a previsão legal, pois as partes poderão convencionar o tempo para sustentação oral, por exemplo. Então, será preciso haver limitação nesse sentido”, alertou.

Também foram elencadas mudanças relacionadas à Tutela Provisória,  fundamentação da sentença, honorários advocatícios, sistema recursal, prazos processuais e outros pontos do novo Código.

Solenidade de abertura

 

Os magistrados Paulo Périssé, Ronaldo Callado e José Nascimento; e o representante da empresa patrocinadora, Leandro Guimarães, compuseram a mesa de abertura do EMAT

 

Para dar as boas vindas aos participantes do XXIX Encontro dos Magistrados da Justiça do Trabalho da 1ª Região, o presidente da Amatra1, Paulo Périssé, convidou o representante da Escola Judicial do TRT/RJ, desembargador José Nascimento de Araújo Netto, e o Juiz Titular da Região de Itaguaí, Ronaldo Callado. Todos frisaram a importância dos debates que seriam fomentados ao longo do evento, para melhor percepção dos novos caminhos que o Código de Processo Civil traçará para a magistratura.O representante do Banco do Brasil, Leandro Guimarães, também compôs a mesa de abertura.