O servidor do TRT-1 Rogério Roberto da Silva, deficiente visual, e a assistente social Karla Valle, da Coordenadoria de Saúde do Tribunal, conversaram sobre deficiências, inclusão social e respeito às diferenças na live cultural sobre o filme “A família Bélier”, nesta sexta-feira (6). A ex-presidente da AMATRA1 Luciana Neves, deficiente auditiva, mediou o debate, e a diretora da associação Gláucia Gomes a auxiliou. O encontro está disponível no canal da AMATRA1 no YouTube e no Facebook.
A obra francesa de comédia dramática mostra a história de uma família composta por três pessoas surdas e uma ouvinte. No dia a dia, a adolescente Paula (Louane Emera) facilita a comunicação dos pais e do irmão – Rodolphe (François Damiens), Gigi (Karin Viard) e Quentin (Luca Gelberg) -, como intérprete, enquanto também lida com a rotina na escola e as descobertas da idade. Paula fica confusa quando um professor nota seu talento para o canto e a incentiva a investir na carreira em Paris, sem saber se deve deixar a família ou viver seu sonho em outra cidade.
A juíza Luciana afirmou que o filme trata das emoções, do relacionamento e da interdependência familiar, promovendo diferentes reflexões. “Em especial, nos faz refletir sobre quem é o diferente naquela família. Costumam achar que o deficiente é o diferente, mas isso depende do olhar, da situação e, principalmente, do comportamento social – tanto do deficiente quanto da sociedade como um todo, que estabelece os padrões”, disse.
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Irmã de dois deficientes auditivos, Karla destacou que, além da deficiência, a produção fala das diferenças, do senso de alteridade e da “capacidade de cada um de reconhecer e olhar para o próximo em suas diferentes nuances”. A doutora em Serviço Social pela UFRJ pontuou que a temática do filme é atravessada pelas barreiras atitudinais, que são comportamentos, intencionais ou não, que impedem o acesso pleno das pessoas com deficiência aos ambientes e ao convívio em sociedade.
“A deficiência tem relação com algum parâmetro. Tendemos a demarcar um ideal que, na verdade, não é o de nenhum de nós; todos somos marcados por peculiaridades. Esse ideal tende a superdimensionar as especificidades humanas, que é intrinsecamente humano. O ‘ser deficiente’ é uma condição intrínseca, uma realidade que faz parte do indivíduo como um todo. Não é uma coisa que alguém porta, que o torna um super herói ou um coitadinho. E o grande problema é que ainda pensamos a deficiência sobre as representações do senso comum”, ressaltou.
Para Rogério, que conhece “os dois lados da moeda” por já ter enxergado e, em decorrência de um acidente de carro, ter perdido a visão, não existe “estado normal”. “Todos são normais. Não existe essa questão. No caso da família, quem é o diferente? Os pais criaram tanto a Paula quanto o irmão, não dependiam dela. Sempre se viraram sem precisar de alguém tutelando. É uma família estruturada, apesar de acharem que não é uma família ‘normal’. Não acho isso.”
Inclusão social no trabalho
Nas relações de trabalho, muitos avanços e mudanças necessárias já foram executadas para incluir pessoas deficientes, mas ainda existe um longo caminho a ser percorrido, afirmou Karla. “A inclusão é uma via de mão dupla. De fato, existe a parcela do sujeito, mas também se tem a parcela da sociedade, de construir os meios para ser possível o trabalho e a integração. É preciso retirar a igualdade abstrata.”
Servidor da 8ª Vara do Trabalho de Niterói, Rogério contou que seu ingresso no Tribunal foi difícil, mas marcou um novo recomeço em sua história. Ele classifica a integração com os colegas como “interessante”, principalmente porque nenhum companheiro de trabalho havia convivido com um deficiente físico antes.
“Eles me relataram ter sido extremamente importante para saber lidar e ver que não há nenhum tipo de diferença. É engraçado porque a convivência flui tão normal que às vezes eles esquecem que não enxergo. Isso aconteceu não só na vara como no fórum todo”, disse.
A magistrada Luciana também é integrada ao local de trabalho, recebendo apoio do secretário de audiência e dos demais servidores. Durante a pandemia da Covid-19, ela tem participado das audiências telepresenciais.
“Termino exausta, mas feliz por poder estar trabalhando normalmente, como todos os meus colegas. Para mim, isso é um prazer inenarrável. A inclusão não é tornar diferente, é incluir mesmo”, afirmou a juíza.
Veja a live na íntegra: