23 de novembro de 2020 . 15:12

‘Passado escravocrata está presente no racismo estrutural’, diz Magna Lima

A Pequena África, localizada no centro da cidade do Rio de Janeiro, foi o tema da live promovida pela Diretoria de Cidadania e Direitos Humanos da AMATRA1, nesta quinta-feira (19). Para marcar o Dia da Consciência Negra, o encontro debateu o passado escravocrata, o racismo estrutural e a importância da cultura negra na formação do Rio. Transmitido no YouTube e no Facebook, o evento contou com a participação de Antonio Marcelo Jackson, bacharel em História e mestre e doutor em Ciência Política, e da socióloga e advogada Magna Corrêa de Lima, mestre em Direito da Cidade. A juíza aposentada Márcia Cristina Teixeira foi a mediadora. 

“Novembro é o mês da consciência negra; de reforçar o debate em torno da sociedade igualitária que queremos, ainda mais em tempos de negação. Nega-se o racismo, mas aponta-se a porta dos fundos aos negros, a quem são destinados os empregos mais subalternos, os menores salários e as piores condições de trabalho. A discriminação é insidiosa e perversa”, afirmou Márcia.

A origem da expressão “Pequena África”, criada pelo compositor e cantor Heitor dos Prazeres, foi explicada por Antonio Marcelo, que exibiu um mapa da região. Segundo o professor do Departamento de Educação e Tecnologias da Universidade Federal de Ouro Preto, o termo se referia, inicialmente, à área da Praça Onze, onde havia grande concentração de negros, rodas de samba e terreiros. No entanto, percebeu-se que as características também estavam presentes em outros locais.

“Na verdade, todo o centro do Rio de Janeiro era ocupado por negros. Podemos seguir da Rua Barão de São Félix até a região entre os morros do Livramento e da Conceição, originalmente chamada pelos portugueses de Vale Longo e que, posteriormente, recebeu o nome de Valongo; ir até a região próxima ao Centro Cultural Banco do Brasil; e, por fim, chegar à região portuária, na Praça Mauá, Pedra do Sal, Gamboa e Santo Cristo, para concluirmos que toda essa área é a Pequena África.”

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Antonio Marcelo destacou que o local guarda um paradoxo de beleza e sofrimento. “Por um lado, tem a ver com a questão cultural. Porém, essa mesma região é também o lugar da dor, onde desembarcaram de um a dois milhões de negros escravizados ao longo de todo o período colonial e nos primeiros anos da independência”, disse.

Para Márcia, a região é “de fundamental contribuição cultural, social e econômica” para o Rio de Janeiro, sendo “um lugar de dor, sofrimento, morte, samba, religião, alegria, orgulho e resistência”.

A socióloga e advogada Magna Corrêa pontuou que este território, onde foi construída a história da formação social brasileira, compreende as contradições próprias ao Rio de Janeiro: ao mesmo tempo em que é irreverente e carinhoso, também é extremamente hostil.  De acordo com Magda, a cidade, por ter sido sede do Império e a antiga capital da República, também contém “todo o conjunto de signos que dizem respeito à história dramática e, infelizmente, bastante pesada da história do Brasil e do trabalho no Brasil”.

“Nessa história conservadora e de olhar dominante, vemos que não só a violência física esteve presente, através da tortura, da morte, das feridas e das violências afetivas. Mas, também, há uma violência simbólica muito grave que é, a partir de uma história oficial, ter a efetividade da intenção de apagamento da história do nosso passado escravocrata”, afirmou a professora de Direito Constitucional da Universidade Cândido Mendes.

Segundo Magna, há a busca de reparação histórica para relembrar que a formação social brasileira “carrega o fardo gravíssimo do passado escravocrata”. E este passado se reflete, hoje em dia, nas discriminações raciais.

“O passado escravocrata está presente no racismo estrutural, que está tão banalizado e naturalizado, com a continuidade das mortes e execuções, principalmente de pretos, pardos, jovens pobres, periféricos. Está presente na segregação territorial, nas marcas da pobreza e da miséria.”

Veja a live na íntegra:
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