Aumento expressivo levou a abrir diálogo com sindicatos para enfrentar efeitos do aquecimento global nas relações laborais
O número de denúncias relacionadas ao calor excessivo e ao desconforto térmico encaminhadas ao Ministério Público do Trabalho (MPT) no país subiu de 154 em 2022 para 741 em 2024 — um crescimento de 381% no período, coincidindo com o ano mais quente já registrado. As queixas de trabalhadores de diversos setores em todo o país levaram o MPT a instaurar canais permanentes de diálogo com sindicatos patronais e de empregados para discutir medidas de adaptação às altas temperaturas.
Em entrevista ao Estadão, a procuradora do Trabalho Cirlene Zimmerman, titular da Coordenadoria Nacional de Defesa do Meio Ambiente do Trabalho e da Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora, o aumento das denúncias está diretamente associado às ondas de calor mais intensas. As ocorrências envolvem principalmente empregados de comércios e escritórios com climatização precária, além de profissionais que atuam ao ar livre - como vigilantes, motoristas, trabalhadores da construção civil e de manutenção de redes. Há registros de desmaios em ambientes fechados e de condições inadequadas de conforto térmico.
Uma pesquisa da plataforma de currículos OnlineCurriculo reforça o impacto das altas temperaturas nas condições de trabalho. O levantamento aponta que 83% dos trabalhadores brasileiros já sentiram mal-estar no ambiente profissional em razão do calor, relatando sintomas como dor de cabeça, fraqueza e tontura. A percepção crescente do problema tem ampliado a pressão sobre empresas para adotar políticas de proteção e conforto térmico.
Em resposta ao avanço das queixas, o MPT iniciou tratativas com entidades representativas de várias categorias para negociar medidas preventivas. Entre os setores mobilizados está o de vigilância, que passou a discutir o uso de uniformes mais leves. No Estado de São Paulo, o acordo coletivo assinado neste ano incluiu a possibilidade de uso de bermudas e camisas de manga curta, condicionada à aprovação da Polícia Federal.
As recomendações do órgão incluem ajustes nos horários de trabalho para evitar a exposição solar nos períodos de maior calor, oferta de pausas regulares, disponibilização de água potável em temperatura adequada e reposição de sais minerais. Também são indicados uniformes compatíveis com o clima e ações de monitoramento dos riscos ambientais.
Entre empregadores, contudo, há resistência a mudanças na jornada, especialmente em setores com convenções coletivas que preveem pagamento de horas extras após as 17h. Apesar dessa limitação, o MPT defende que as empresas têm responsabilidade direta na identificação e mitigação dos riscos climáticos no ambiente de trabalho.
Embora os dados de 2025 indiquem uma leve redução de 1,9% nas denúncias até agosto, o órgão mantém a articulação com sindicatos e empresas, diante da tendência de aumento das temperaturas e da necessidade de adaptação das rotinas laborais ao novo cenário climático.
De acordo com estudo divulgado pela Fundacentro, órgão vinculado ao Ministério do Trabalho e Emprego, a exposição ocupacional ao calor em atividades a céu aberto “tende a ser uma determinante para o aumento de doenças e acidentes relacionados à segurança e à saúde no trabalho”. O levantamento alerta que as mudanças climáticas ampliam a vulnerabilidade de trabalhadores de setores como agricultura, construção civil e transporte.
Com informações do Estadão.
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