Resgate revela exploração de trabalhadores em avicultura no RS

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Resgate revela exploração de trabalhadores em avicultura no RS
Dez trabalhadores foram resgatados em Passo Fundo (RS) após serem submetidos a condições análogas à escravidão na coleta de frangos destinados à JBS Aves. Embora a contratação tenha ocorrido por meio da terceirizada MRJ Prestadora de Serviços, a empresa foi responsabilizada diretamente pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), pois, segundo a legislação que regulamenta terceirizações, cabe à contratante fiscalizar e garantir condições adequadas de trabalho quando o serviço ocorre em suas dependências.

Os trabalhadores enfrentavam jornadas de até 16 horas diárias, sem pausas regulares para alimentação, e consumiam aves descartadas por estarem fora do padrão exigido pela empresa. Dois deles precisaram de atendimento hospitalar devido ao esgotamento físico. A fiscalização também identificou que as despesas de transporte e alimentação foram indevidamente convertidas em dívidas, vinculando os trabalhadores ao serviço por meio de coação financeira.

A autuação, formalizada em abril de 2025, revelou que a JBS Aves elaborava os cronogramas diários para a captura dos frangos nas granjas — etapa conhecida como “apanha de frango”. Esses cronogramas eram repassados com 24 horas de antecedência à empresa MRJ, junto com a imposição de multas por eventuais atrasos. Segundo os auditores, essa prática demonstra que a JBS exercia controle direto sobre a execução do serviço, ficando, portanto, responsável pelas irregularidades identificadas

 

O grupo de resgatados incluía migrantes de Pernambuco, Bahia, Maranhão e um trabalhador da Argentina. Eles relataram aos fiscais episódios de fraqueza e tontura e devido ao trabalho contínuo sem qualquer pausa, como no caso de um trabalhador que movimentou 13 cargas de frango em um único dia. O peso médio transportado por caminhão era de 16 toneladas, distribuídas em cerca de 540 caixas plásticas.

As investigações também constataram tráfico de pessoas com fins de exploração laboral. Parte dos trabalhadores foi aliciada no Nordeste com promessas de salários atrativos e boas condições de moradia, mas, ao chegarem ao Sul, foram submetidos a dívidas impostas e obrigados a arcar com custos de alojamento e alimentação. O trabalhador estrangeiro relatou ter sido ameaçado de deportação caso denunciasse a situação.

Durante as inspeções, quatro alojamentos da MRJ foram fiscalizados. Em um deles, trabalhadores informaram estar sem água havia duas semanas. O local não possuía camas suficientes nem pias nos banheiros, o que, segundo os fiscais, caracterizou condições degradantes. A MRJ foi autuada em 20 infrações, incluindo a manutenção de trabalhadores em situação análoga à escravidão.

Embora a JBS Aves tenha realizado seis inspeções nas frentes de trabalho entre agosto de 2023 e dezembro de 2024, o MTE considerou as ações insuficientes diante da vulnerabilidade e da extensão das atividades. A prestação de serviços, segundo o auto de infração, ocorria pelo menos desde agosto de 2023.

Em resposta à autuação, a JBS informou que suspendeu imediatamente a prestação de serviços, encerrou o contrato com a MRJ e bloqueou a terceirizada. A empresa declarou que recorre da autuação e reiterou ter “tolerância zero com violações de práticas trabalhistas e de direitos humanos”. A MRJ não foi localizada pela reportagem.

A JBS Aves ainda pode recorrer do auto de infração em duas instâncias administrativas. Caso a responsabilização seja mantida, a empresa será incluída no Cadastro de Empregadores que tenham submetido trabalhadores a condições análogas à escravidão, conhecido como “Lista Suja”.

Com informações do UOL - Foto de capa: Trabalhador em granja/Inspeção do Trabalho.

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