A Companhia de Geração Térmica de Energia Elétrica (CGTEE) não tem de oferecer tratamento isonômico aos empregados da Thorga Engenharia Industrial, de quem toma serviços por terceirização. Afinal, na relação entre ambas as empresas, não ficou configurada a intermediação irregular de mão-de-obra. Foi o que decidiu, por maioria, a 4ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho do Rio Grande do Sul ao negar provimento à apelação de um terceirizado que buscava diferenças salariais e trabalhistas com empregados da tomadora. A decisão é do dia 1º de fevereiro. Cabe recurso ao Superior Tribunal do Trabalho.
O autor ingressou com uma reclamatória trabalhista na 1ª Vara do Trabalho de Bagé (RS) contra as duas empresas — uma terceira saiu do pólo passivo no decorrer do processo. Disse que, embora tenha trabalhado formalmente para a Thorga Engenharia, o vínculo pessoal e subordinado, desde o início, estabeleceu-se diretamente com a CGTEE. Alega que tem direito a perceber remuneração equivalente à percebida pelos empregados da estatal, como preconiza o artigo 12, alínea “a”, da Lei 6.019/1974, bem como a garantia de percepção do salário previsto no quadro de carreira daquela empresa.
Em síntese, postulou o pagamento de diferenças salariais com relação ao cargo de Auxiliar Técnico V – Assistente Técnico, nível 5, funções de mecânico ajustador, e reflexos; diferenças de horas extras, FGTS e de seguro-desemprego, pela consideração dos salários e vantagens devidos aos funcionários da CGTEE; e o pagamento de abonos salariais, gratificação de farmácia, bônus-alimentação, gratificação de após-férias, gratificação especial e participação nos resultados, nos termos, ainda, do artigo 7º, inciso XXX, da Constituição de 1988, bem como dos artigos 460 e 9º da Consolidação das leis do Trabalho.
As empresas reclamadas contestaram. Afirmaram que as parcelas pleiteadas são indevidas porque o autor não era empregado ou fiscalizado pela estatal. Reafirmaram que este apenas prestou serviços para a CGTEE na qualidade de empregado da empresa prestadora — o verdadeiro ente que o contratou pagou seus salários, lhe concedeu férias e o indenizou, quando dispensado.
Ademais, argumentaram que não se poderia falar na aplicação analógica do artigo 12 alínea “a”, da Lei 6.019/1974 uma vez que a prestadora de serviços não é empresa de trabalho temporário, na forma exigida pelo artigo 5º da referida Lei. Em razão disto, alegaram que nada deviam ao autor.
O juiz do Trabalho Marcello Dibi Ercolani disse que o autor foi contratado pela Thorga como mecânico ajustador e que as divergências se resumiam à forma como este serviço era prestado e à real função exercida. Embora reconheça que o trabalhador terceirizado tenha direito às mesmas verbas asseguradas ao contratado pelo ente estatal tomador dos serviços, afirmou que não há como deferir, no caso dos autos, a pleiteada isonomia. É que a equiparação normativa só será assegurada quando for constatada a contratação irregular — ou ilícita.
‘‘No presente caso, a terceirização foi lícita, o que se pressupõe, uma vez que tal fato não foi questionado nesta ação. Assim sendo, não há que se falar em isonomia de salários entre desiguais, mormente quando se trata de terceirização lícita admitida no ordenamento jurídico’’, complementou o juiz.
Ele destacou, ainda, o objeto social de cada empresa e sua relação com o trabalhador. A CGTEE tem por finalidade a geração de energia elétrica, enquanto a Thorga presta serviços de apoio técnico às Unidades Geradoras do Departamento de Produção de Candiota (DTC). ‘‘Portanto, as atividades de mecânico, exercida pelo autor, não constituem atividades ligadas à atividade-fim da primeira ré (CGTEE)’’, concluiu.
Objeto social
Inconformado com o teor da sentença, o trabalhador interpôs recurso ordinário no TRT, sob as mesmas alegações expressas na inicial. Em síntese, defendeu que o fato de ter havido a terceirização da atividade-fim, o que é vedado, teria atraído a incidência da orientação jurisprudencial SDI-1 383 do TST. Ela diz: ‘‘A contratação irregular de trabalhador, mediante empresa interposta, não gera vínculo de emprego com ente da Administração Pública, não afastando, contudo, pelo princípio da isonomia, o direito dos empregados terceirizados às mesmas verbas trabalhistas legais e normativas asseguradas àqueles contratados pelo tomador dos serviços, desde que presente a igualdade de funções. Aplicação analógica do artigo 12, ‘a’, da Lei nº 6.019, de 03.01.1974.’’
O relator do recurso, desembargador Ricardo Tavares Gehling, da 4ª Turma, considerou correta a posição do juiz Marcello Dibi Ercolani em não reconhecer ao autor o direito aos salários e demais parcelas asseguradas aos empregados da tomadora de serviços. ‘‘O tratamento isonômico entre empregados terceirizados e da tomadora de serviços tem cabimento quando houver intermediação irregular de mão-de-obra, do que não se cogita na espécie. Logo, não existe suporte fático para aplicação, ao caso em exame, da Orientação Jurisprudencial 383 da SDI-1 do TST’’, concluiu, negando provimento do recurso.
O desembargador Hugo Carlos Scheuermann divergiu do relator. Ele entendeu que as atividades desempenhadas pelo reclamante — manutenção dos equipamentos — fazem parte da cadeia produtiva da empresa e, como tal, se inserem na sua atividade-fim, de modo que se mostra inviável reconhecer terceirização lícita. ‘‘Trata-se, na verdade, a meu ver, de intermediação ilícita de mão-de-obra, o que caracteriza a hipótese de ‘contratação irregular’ do reclamante, atraindo, em decorrência, a incidência da aplicação da OJ 383 da SDI 1 do TST’’, expressou, votando pelo provimento.
O terceiro a votar foi o juiz convocado Lenir Heinen, que acompanhou o entendimento do relator. ‘‘De qualquer modo, e ainda com o risco de ser simplista, poder-se-ia afirmar que, para efeito dos ‘serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador’ (assim referidos na Súmula), ocorre atividade-fim quando há coincidência da atividade com o objeto social da empresa e, por outro lado, há atividade-meio quando tal situação não ocorre’’, afirmou.