Discussões sobre assédio e combate a abusos no ambiente de trabalho marcaram último dia do encontro, que reuniu magistrados, ministros e pesquisadores no TRT-1
O 34º EMAT terminou nesta sexta-feira (12/09) no TRT-1, no Rio de Janeiro, com debates sobre assédio no ambiente de trabalho que reuniram magistrados, ministros, pesquisadores, advogados e estudantes de Direito. No painel final, a ministra do TST, Delaíde Alves Miranda Arantes, alertou para as diferentes formas de violência que ainda persistem nas relações laborais e defendeu políticas de conscientização, prevenção e responsabilização.
“Direitos humanos são essenciais à concretização da justiça social”, afirmou a ministra durante o evento, que abordou ainda assédio moral, sexual e processual. “O primeiro passo para a prevenção é educar as pessoas para que ajam de maneira correta no cotidiano com seus companheiros de trabalho. É muito importante se colocar no lugar do outro.”
Pela manhã, a programação abriu espaço para uma conversa com o corregedor regional, desembargador Álvaro Luiz Carvalho Moreira, com a mediação da presidenta da Amatra, Daniela Muller. Em seguida, as magistradas Aline Leporaci, do TRT-1, e Valdete Souto, do TRT-4, examinaram as práticas de assédio processual e seus impactos na efetividade da prestação jurisdicional.
Aline destacou que o assédio processual passou a ser identificado a partir de casos em que partes ajuizavam sucessivas ações ou adotavam estratégias protelatórias sem fundamento, com o objetivo de prolongar litígios ou desestabilizar a parte contrária. Valdete buscou inserir o tema em uma perspectiva histórica, ressaltando que o discurso do assédio processual é recente na Justiça do Trabalho e que só pode ser compreendido na perspectiva da formação do processo trabalhista no Brasil.
“Quem já habitava este território (Brasil) não tinha a menor noção do que significam propriedade privada, direito, processo e contrato. Tudo isso chegou como um pacote imposto. E o que isso tem a ver com o processo de trabalho? Tudo. Por quase 400 anos, o trabalho em sociedades colonizadas como a nossa foi tomado à força. Aqui consolidou-se a ideia de que o trabalho é algo destinado a corpos considerados de ‘segunda categoria’”, disse Valdete.
Outro debate analisou a instrumentalização do processo e o uso estratégico da Justiça por litigantes habituais. Conduzidas por Rafael Pazos Dias e com a participação de Daniela Muller e Natália Cabral, as discussões destacaram a violência de gênero dentro dos processos judiciais e analisaram o seu caráter simbólico.
À tarde, o painel sobre assédio sexual nas relações de trabalho, no qual a ministra Delaíde participou, chamou a atenção para a gravidade do problema. Na mesa, estavam a desembargadora Sayonara Grillo e a juíza Monique Caldeira, que explicou que o assédio no trabalho pode ser sexual (vertical, horizontal ou por chantagem) ou moral/ambiental, afetando as funções exercidas pela vítima e sua própria vida. Um dos pontos enfatizados foi o fato de que as provas são fragmentadas, e a palavra da vítima, decisiva. É importante que o Ministério Público do Trabalho atue em todas as fases e, em caso de envolvimento de menor, a escuta deve ser acolhedora e acompanhada por profissionais.
A juíza Luciana Conforti, ex-presidenta da Anamatra, celebrou sua participação no EMAT e ressaltou a importância do apoio e da reciprocidade no meio associativo. Em sua fala, destacou o papel do processo penal feminista na desconstrução do machismo estrutural no sistema de Justiça, analisando casos emblemáticos como o de Ângela Diniz e outros de grande repercussão, a exemplo dos que envolveram o goleiro Bruno e o jogador Robinho. Também criticou a tese inconstitucional da “legítima defesa da honra” e lembrou que a mobilização social e os movimentos feministas foram decisivos para mudar a percepção jurídica sobre o tema, reforçando a necessidade de enfrentar a violência em todas as fases processuais.
O último dia também foi marcado pelo lançamento de diversas obras. Entre elas, Manual de Processo do Trabalho, de Aline Leporaci e Bianca Merola da Silva; Licenças Parentais: a construção de um novo direito do trabalho e previdenciário, de João Renda; Inteligência Artificial e Provas Digitais – A revolução da Justiça?, de Patrícia Medeiros e Valéria Ribeiro; (In)delicadezas, de Kiria Garcia; A culpa deve ser do sol, de Gustavo Tadeu; e Racismo em debate: quando as opressões se somam, de Valdete Souto.
“Muitas vezes o trabalho de pesquisa e de escrita é solitário, até tormentoso”, disse João Renda, elogiando o espaço de diálogo aberto por eventos como o EMAT. Sua obra, originada da tese de doutorado e enriquecida por vivências pessoais, discute as falhas do sistema brasileiro de licenças parentais, que limita a paternidade a cinco dias e a maternidade a 120, perpetuando desigualdades estruturais.
O encontro terminou em clima de festa e samba no terraço do TRT-1. Ao fazer um balanço positivo, a presidenta da Amatra1, Daniela Muller, destacou que o propósito do evento é inspirar e fortalecer os participantes para os desafios da missão que têm pela frente.
“Que nos inspire, nos dê força e energia para cumprir criteriosamente a Constituição Federal, respeitar sempre o Estado Democrático de Direito e concretizar o Direito do Trabalho, que para muitas pessoas representa a proteção da própria vida, como a Valdete já mencionou, assim como a defesa dos direitos humanos. Que, com isso, possamos contribuir para a construção de um mundo um pouco melhor”, concluiu.
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