Levantamento revela que maioria das magistradas enfrenta preconceito racial, de gênero, adoecimento mental e barreiras na carreira
A Enamat divulgou a pesquisa Dificuldades na Carreira da Magistrada 2025, que identificou que 68,2% das juízas do Trabalho já sofreram atitudes discriminatórias no exercício do cargo. O estudo de abrangência nacional, que ouviu 749 juízas, tanto em atividade quanto aposentadas, também mostrou que 82,4% desenvolveram algum tipo de condição relacionada à saúde mental após o ingresso na carreira, evidenciando o impacto de fatores estruturais, raciais e de gênero no cotidiano da magistratura.
Os dados, analisados sob perspectiva interseccional, apontam que a magistratura trabalhista segue marcada por desigualdades de acesso, reconhecimento e progressão profissional, reforçadas por sobrecarga doméstica e insuficiência de políticas institucionais de acolhimento.
O levantamento traçou o perfil das magistradas brasileiras: 79,4% das juízas se autodeclaram brancas, 98,7% cisgênero e a maior parte tem origem nas regiões Sudeste e Sul do país. As conclusões indicam que o ingresso na carreira exige elevado capital econômico e social — 61,8% das respondentes recebiam mais de cinco salários mínimos antes de assumirem a magistratura —, o que, segundo o relatório, restringe o acesso de mulheres de camadas populares e acaba reproduzindo o mesmo perfil social dentro da carreira.
A pesquisa mostra que as desigualdades não se limitam à entrada na carreira. Quase todas as magistradas (92%) afirmaram precisar se esforçar mais que os colegas homens para comprovar competência, enquanto 59,1% não percebem igualdade de condições para concorrer a mandatos associativos ou cargos diretivos. Entre as magistradas negras, 75% disseram que já tiveram sua autoridade questionada, revelando sobreposição de discriminações por gênero e raça.
Os episódios de violência também se destacam. Mais da metade das participantes relatou ter sofrido microagressões (53,9%) e 39,4% agressões verbais, atribuídas principalmente a advogados. Casos de violência psicológica atingem 39,4% das juízas, e 5,3% relataram assédio sexual — em sua maioria praticado por outros magistrados. A subnotificação é expressiva: apenas 7,3% comunicaram formalmente o tribunal sobre as ocorrências.
No campo da saúde, o levantamento identificou incidência significativa de estresse (58,1%), ansiedade (56%) e insônia entre as juízas, especialmente na faixa de 41 a 50 anos. A Enamat destacou que 95% das juízas diagnosticadas associam o adoecimento à rotina de trabalho e à ausência de suporte institucional, apontando a necessidade de medidas preventivas e acompanhamento psicológico regular.
Outro ponto de destaque é a sobrecarga doméstica. Sessenta e um por cento das magistradas afirmaram ser as principais responsáveis pelos cuidados com filhos e 15% cuidam de pessoas com deficiência ou doenças graves, dedicando de cinco a dez horas semanais a essas atividades. O relatório conclui que a persistência da dupla jornada impacta a produtividade e limita a progressão profissional, expondo a insuficiência de políticas de corresponsabilização e acolhimento.
Para a ministra Kátia Arruda, ex-diretora da Enamat, os resultados reforçam a importância de ações institucionais voltadas à igualdade de oportunidades e ao enfrentamento da discriminação. Segundo ela, compreender as dificuldades relatadas é fundamental para “garantir um ambiente de trabalho seguro e justo para todas as profissionais” e ampliar a presença feminina também em cargos de direção nos tribunais.
O estudo, elaborado pela Coordenadoria de Pesquisa da Enamat com apoio das comissões de gênero e raça da instituição, atualiza dados da edição de 2019 e será utilizado como base para formulação de novas políticas públicas voltadas à promoção da equidade e à prevenção de violências na magistratura trabalhista.
Com informações do Enamat.
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