23 de fevereiro de 2022 . 14:03

TST: Ação sobre fraude na terceirização deve incluir as duas empresas

Os ministros do Tribunal Superior do Trabalho (TST) decidiram, por maioria, que as empresas tomadoras e as prestadoras de serviços devem fazer parte das ações que discutem a licitude da terceirização, e que as decisões devem produzir efeitos idênticos para as duas. Agora, trabalhadores que quiserem contestar fraudes na terceirização poderão processar ambas. A tese jurídica sobre os desdobramentos da decisão do STF a respeito do tema, em 2018, foi fixada no âmbito do TST nesta terça-feira (22).

Há quatro anos, o Supremo definiu ser constitucional a terceirização de serviços ou outras formas de divisão do trabalho entre pessoas jurídicas distintas, sem caracterizar vínculo de emprego entre a tomadora de serviços e o trabalhador e mantendo a responsabilidade subsidiária da empresa contratante, caso a prestadora fique impossibilitada de cumprir os pagamentos e demais obrigações trabalhistas. No julgamento em questão, os ministros do STF consideraram inconstitucional a Súmula 331 do TST, que proibia a terceirização. 

No presente julgamento do TST, prevaleceu o voto do revisor, ministro Douglas Alencar Rodrigues, com entendimento parcialmente divergente do relator, ministro Cláudio Brandão. Segundo Rodrigues, o litisconsórcio – inclusão de ambas as empresas no polo passivo dos processos – é necessário e unitário. Acompanharam o entendimento as ministras Maria Cristina Peduzzi, Dora Maria da Costa e Morgana Richa, e os ministros Emmanoel Pereira, Caputo Bastos, Aloysio Corrêa da Veiga, Evandro Valadão, Alexandre Ramos, Dezena da Silva, Ives Gandra Martins Filho, Amaury Rodrigues e Renato de Lacerda Paiva.

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De acordo com o voto vencedor, os processos desta natureza envolvem uma relação triangular entre trabalhador, empresa prestadora e empresa tomadora de serviços. “O debate sobre a licitude do contrato de prestação de serviços firmado entre as empresas, sob a perspectiva da fraude, não pode ser travado sem que ambas compareçam ao polo passivo”, pontuou o magistrado.

Já para o relator, ministro Brandão, o litisconsórcio deveria ser facultativo. Assim, ficaria a critério do trabalhador terceirizado decidir se ingressaria com ação judicial contra uma das empresas envolvidas ou se citaria as duas companhias. 

No entanto, convergindo com o voto de Rodrigues, Brandão apresentou a tese de que a decisão seja unitária – aplicada às duas empresas. O ministro Augusto César divergiu parcialmente para propor o reconhecimento do litisconsórcio simples, com decisões diferentes para cada parte do polo passivo, mas seu voto foi vencido.  

O diretor da AMATRA1 Felipe Bernardes explica que o entendimento do TST tem caráter processual, referente, por exemplo, a situações em que apenas uma das empresas – terceirizada ou a tomadora de serviços – interpôs o recurso. 

“Os ministros definiram que a decisão deve ser uniforme, idêntica para as duas empresas. Então, acaba tendo efeito em recursos que foram interpostos no TST ou no STF por apenas uma das empresas. A situação típica é a de que o Tribunal Regional do Trabalho concluiu pela existência da terceirização ilícita, porque era em atividade fim, antes de o Supremo decidir a questão. Com a definição do Supremo e a interposição do recurso por apenas uma das empresas, abriu-se discussão para se poderia ter efeitos diferentes, já que somente uma delas recorreu”, afirmou Bernardes. 

“Agora, o TST decidiu que a decisão deve ser uniforme para as duas. Logo, ambas - terceirizada e tomadora de serviços - precisam estar no processo e a decisão vai ser idêntica para as duas”, completou o juiz.

Leia, na íntegra, a tese fixada pelo TST sobre a terceirização de serviços:

1) Nos casos de lides decorrentes da alegação de fraude, sob o fundamento de ilicitude da terceirização de atividade-fim, o litisconsórcio passivo é necessário e unitário. Necessário, porque é manifesto o interesse jurídico da empresa de terceirização em compor essas lides e defender seus interesses e posições, entre os quais a validade dos contratos de prestação de serviços terceirizados e, por conseguinte, dos próprios contratos de trabalho celebrados; Unitário, pois o juiz terá que resolver a lide de maneira uniforme para ambas as empresas, pois incindíveis, para efeito de análise de sua validade jurídica, os vínculos materiais constituídos entre os atores da relação triangular de terceirização.

2) A renúncia à pretensão formulada na ação não depende de anuência da parte contrária e pode ser requerida a qualquer tempo e grau de jurisdição; cumpre apenas ao magistrado averiguar se o advogado signatário da renúncia possui poderes para tanto e se o objeto envolve direitos disponíveis. Assim, é plenamente possível o pedido de homologação, ressalvando-se, porém, ao magistrado o exame da situação concreta, quando necessário preservar, por isonomia e segurança jurídica, os efeitos das decisões vinculantes (CF, art. 102, § 2º; art. 10, § 3º, da Lei 9.882/99) e obrigatórias (CPC, art. 927, I a V) proferidas pelos órgãos do Poder Judiciário, afastando-se manobras processuais lesivas ao postulado da boa-fé processual (CPC, art. 80, I, V e VI). 2.1) Depois da homologação, a parte autora não poderá deduzir pretensão contra quaisquer das empresas - prestadora-contratada e tomadora-contratante - com suporte na ilicitude da terceirização da atividade-fim (causa de pedir). 2.2) O ato homologatório, uma vez praticado, acarreta a extinção do processo e, por ficção legal, resolve o mérito da causa (artigo 487, III, “c”, do CPC), produz coisa julgada material, atinge a relação jurídica que deu origem ao processo, somente é passível de desconstituição por ação rescisória (CPC, arts. 525, § 15, 535, § 8º, e 966) ou ainda pela via da impugnação à execução (CPC, art. 525, §12) ou dos embargos à execução (CPC, art. 535, § 5º) e acarretará a perda do interesse jurídico no exame do recurso pendente de julgamento. 

3) Em sede de mudança de entendimento desta Corte, por força da unitariedade imposta pela decisão do STF (“superação abrupta"), a ausência de prejuízo decorrente da falta de sucumbência cede espaço para a impossibilidade de reconhecimento da ilicitude da terceirização. Sendo assim, como litisconsorte necessário, a empresa prestadora que, apesar de figurar no polo passivo, não sofreu condenação, possui interesse em recorrer da decisão que reconheceu o vínculo de emprego entre a parte autora e a empresa tomadora dos serviços.

4) Diante da existência de litisconsórcio necessário e unitário, a decisão obrigatoriamente produzirá idênticos efeitos para as empresas prestadora e tomadora dos serviços no plano do direito material. Logo, a decisão em sede de juízo de retratação, mesmo quando apenas uma das rés interpôs o recurso extraordinário, alcançará os litisconsortes de maneira idêntica.

5) – Não modular os efeitos desta decisão.

*Foto: Denniz Futalan/Pexels < VOLTAR